27 de set. de 2009

II: Encontrando

Escrito por Fabricio Cantarella

Madrugada já vai alta, o copo, meio vazio desde aquele fatídico dia, desde que me vi novamente sozinho aqui, contemplando a cama gelada, as vozes no silencio que me diziam tudo o que eu não queria ouvir, me lembravam de risos e gemidos, os gritos, o bater da porta.
- Aquele dia que ruiu com meus sonhos, com minha alegrias, minhas esperanças. O dia em que ela se foi.
- É difícil, eu sei, mas você precisa superar.
Pra que raios eu pago um psiquiatra? Pra me dizer só o que eu sei? Ou o que eu não quero admitir?
- Deveria sair e se diver...
- O sexo não é mais divertido, a bebida só me economiza as noites acordado!, gritei, e ah, como foi bom gritar.

Tinham sido dias difíceis, o trabalho pressionava, a inspiração me faltava, a bebida me chamava... foi assim que cedi, que implorei aos céus ou quem quer que me ouvisse pra que ela voltasse, pra que pudesse sentir seu cheiro, seu gosto. Mas os dias passaram, a ressaca ficou, percebi o quanto tinha me isolado, mesmo sendo de poucos amigos, aqueles poucos se afastaram. Precisava correr atrás do prejuízo.

Assistir futebol na quarta, jogar futebol na quinta, sexta, dia sagrado do happy hour, e a confiança voltava, um pouco da alegria voltava.
Eu era amargurado desde aquele fatídico dia, mas ainda conseguia esboçar sorrisos vez ou outra, e, com a ajuda certa, isso se tornava mais frequente.

O domingo chegou, fui ao shopping andar, arejar a cabeça, conversar com uns amigos, ver gente, e, bom, realmente vi gente, vi alguém em específico, alguém que eu achava que jamais poderia ver. Na loja de perfumes, acompanhando um amigo.
- Acha que esse perfume é atraente?, ela me perguntou subitamente.
- Hmm, não sei, talvez esse outro aqui., eu disse.
- Será? Achei forçado demais...
- Bom, depende de quem queres atrair, mas, particularmente, não acho que precises de algo a mais, seu cheiro é naturalmente bom., e realmente, era. Ela cheirava bem, uma mistura harmoniosa de flores de baunilha e cereja. E ela corou com o comentário.
- Prazer, Chaz.
- Desculpe o embaraço, e a pergunta súbita também., ela sorriu um sorriso deslumbrante., bom te conhecer, me chamo Gabriele.
- Posso te pagar um café?
- Tem um Starbucks aqui no shopping, me acompanha.

Gabriele tinha um jeito displicente, divertido, andava levemente, mal fazendo barulho ao pisar o chão, seus olhos brilhavam uma alegria ímpar, incomum nos dias atuais. Tinha o cabelo castanho claro, os olhos cor de mel pareavam com os meus quando se cruzavam. O café escorria vez ou outra por sobre os lábios na boca pequena e rosada e ela, provocantemente (ou não) os lambia demoradamente. Gabriele era um mistério, deliciosa e divertida.

O café foi por minha conta, mas a nota fiscal foi ela quem pegou, e, quando me entregou, havia, rabiscado as pressas na parte de baixo, um número de telefone e um recado: "me ligue quando quiser. G." . E fui pra casa com aquele bilhete aquecendo o bolso do meu jeans com um misto de expectativa e dúvida.

Um comentário:

  1. Além de todos teus encantos, este, desde que eu me recordo, sempre me agradou, você envolve qualquer pessoa com as palavras, e eu vejo um futuro nisto.

    Parabéns, meu amor.

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