29 de abr. de 2011

Drive

Escrito por Fabricio Cantarella

Domingo de manhã, sete horas e eu estou dirigindo.
Vivo boa parte dos meus dias dentro do meu carro. E gosto disso.

Dirigir, para mim, da uma sensação estranha de liberdade, onde tudo faz sentido e eu posso pensar em paz. Quando se é um adolescente e suas preocupações são as espinhas ou se um dia você vai conseguir comer alguém de verdade, trancar-se no quarto, gritar ou passar duas horas tomando banho são refúgios que fazem a mente funcionar e te escondem do resto do mundo, deixando-o em paz para imaginar o que quer que seja sobre seus longos poucos anos de vida. Mas quando chega-se num certo ponto, não muito além da adolescência, mas o suficiente para ver que o mundo vai além das fotos do Orkut, os antigos refúgios já não bastam e se é necessário buscar novos. Eu achei meu carro, assim como imagino que o John Mayer tenha achado o dele em Why Georgia.


Why Georgia?


E é domingo, sete da manhã. Eu acabei de levar minha musa para pegar um ônibus, jantamos juntos, dormimos juntos, nos divertimos e acordamos juntos, banho, café-da-manhã; foram míseros 15 minutos de separação em alguns pares de horas e eu a vi subindo naquele ônibus em direção a um futuro desejado mas incerto. Eu sei que ela vai voltar pra mim, ainda hoje a terei em meus braços, cansada da viagem, mas comigo novamente; só que agora, estou impotente. Fazem vinte minutos agora, que nos separamos, mas já sinto falta do cheiro, do toque, da voz, do sabor dela. Estou dirigindo de volta pra casa.

O céu já vai claro, o sol desponta no céu, no som toca alguma coisa do Third Day e eu me sinto feliz apesar de tudo. Começo a pensar que as coisas estão dando certo, que esse gosto na minha boca é uma amostra do que o futuro pode ser se nós assim quisermos. Relembro da noite anterior, imagino o dia que está por vir, rezo para que ela se saia bem no que está indo fazer e que volte logo para mim. Sinto uma nostalgia preencher meu corpo conforme vou me aproximando de casa, me lembro do tempo em que eu era sozinho, apenas eu e meu carro, meu companheiro de aventuras. Ia e voltava com meu carro, só eu e ele. Pensávamos juntos, minha cabeça fervilhava enquanto eu dirigia pelas ruas escuras e esburacadas do meu bairro, o carro fazia sua parte, sempre colocava no rádio as músicas que eu precisava ouvir e tudo o que eu mais queria era dirigir. Andar sem rumo, sem parar, enquanto ainda houvesse energia para qualquer um de nós dois.

Chego em casa, ainda estou nostálgico e feliz, a saudade me cutuca vez ou outra, mas a esperança fala mais alto. Abro o portão da garagem, não sei o que toca no rádio agora, me dirijo à minha vaga no estacionamento. O banco do passageiro está vazio agora, vai ficar assim até tarde da noite, sinto falta das mãos da minha musa, ocupante cativa do lugar, para receber a minha enquanto dirijo pela cidade. Os sentimentos vão se esvaindo um a um enquanto estaciono, desligo o rádio e sinto o banco vazio ao lado. Pego minha chave, abro a porta. Só resta a saudade. Queria dirigir para sempre, somente nós três – sim, agora somos três – eu, minha musa e meu carro, nossa família (até então).

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